sábado, 14 de novembro de 2009

O sacerdote na celebração eucarística


ROMA, quinta-feira, 13 de novembro de 2009 (ZENIT.org).- Nasce a seção Espírito da Liturgia, que se propõe apresentar, de modo acessível e sintético, diversos temas de teologia litúrgica. Este primeiro artigo apresenta aos leitores o tema geral que se desenvolverá até junho de 2010.

Por Mauro Gagliardi, consultor do Ofício de Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice

O Santo Padre Bento XVI proclamou, como todos sabem, o Ano Sacerdotal (junho de 2009 - junho de 2010), com ocasião do 150° aniversário do dies natalis do Santo Cura d’Ars.

A intenção é “contribuir para promover o compromisso de renovação de todos os sacerdotes para um mais forte e incisivo testemunho evangélico no mundo de hoje” [1]. São João Maia Vianney, além de representar um modelo de sacerdote, sempre anunciou com clareza e ênfase a incomparável dignidade do sacerdócio e a centralidade do ministério ordenado no seio da Igreja. Partindo de seus ensinamentos, o Santo Padre voltou a propor as seguintes palavras do Santo: “Ó, quão grande é o sacerdote!... Se ele compreendesse, morreria... Deus o obedece: ele pronuncia duas palavras e Nosso Senhor desce do céu a sua voz e se deposita em uma pequena hóstia...”. E também: “Retirado o sacramento da Ordem, não teríamos o Senhor. Quem voltou a colocar no sacrário? O sacerdote. Quem acolheu vossa alma ao entrar na vida? Quem a nutre para dar-lhe a força de realizar sua peregrinação? O sacerdote. Quem a preparará para apresentar-se diante de Deus, lavando-a pela última vez no sangue de Jesus Cristo? O sacerdote. E se esta alma morre [pelo pecado], quem a ressuscitará, quem lhe devolverá a calma e a paz? Uma vez mais o sacerdote... Depois de Deus, o sacerdote é tudo!... Ele mesmo não poderia entender bem a não ser no céu” [2].

Como se vê, São João Maria identifica a grandeza do sacerdote com referência privilegiada ao poder que ele exerce nos sacramentos em nome e na Pessoa de Cristo. Bento XVI colocou em evidência este fato, recordando também outras palavras do Cura d’Ars, que se referem em particular ao ministério de celebrar a Santa Eucaristia. O Papa escreve que o Santo “estava convencido de que da Missa dependia todo fervor da vida de um sacerdote: a causa do relaxamento do sacerdote é que não dedica atenção à Missa! Deus meu, como há que compadecer de um sacerdote que celebra como se fizesse uma coisa ordinária!” [3].

O Ano Sacerdotal propões a nossa reflexão a figura do sacerdote e, em particular, sua dignidade de ministro ordenado que celebra os sacramentos, em benefício de toda Igreja, na Pessoa de Cristo, Sumo e Eterno Sacerdote [4].

Neste Ano Sacerdotal, que se celebra entre 2009 e 2010, há também outras celebrações que vale recordar, porque estão intimamente relacionadas com a índole eucarística da dignidade sacerdotal. Em 1969, o Papa Paulo VI promulgava, com a Constituição Apostólica Missale Romanum, o novo Missal, preparado após o Concílio Vaticano II. No presente ano, 2009, portanto, celebram-se 40 anos desta promulgação. Em 2010, celebrar-se-ão outros dois aniversários, também vinculados diretamente com a celebração da Eucaristia. O primeiro coincide com o 40° aniversário (1970-2010) da promulgação da definitiva editio typica (prima) da Institutio Generalis Missalis Romani. O segundo coincide com o 440° aniversário da promulgação do Missal atualmente chamado Vetus Ordo o Usus antiquior, promulgado por São Pio V com a Constituição apostólica Quo primum, de 14 de julho de 1570. Esta Constituição é recordada, junto ao Missal de São Pio V, desde as primeiras palavras da mencionada Constituição apostólica Missale Romanum de Pablo VI [5].


Os dois Missais, unidos também pela celebração de seus respectivos aniversários, são duas formas da única lex orandi da Igreja de Rito latino. A este respeito, expressou-se o Santo Padre Bento XVI, ensinando que, com relação ao Missal de Paulo VI, “o Missal Romano promulgado por São Pio V e novamente editado pelo beato João XXIII deve ser considerado como expressão extraordinária da mesma lex orandi [lei da oração] e deve ser tido em devida honra por seu uso venerável e antigo. Estas duas expressões da lex orandi da Igreja não conduzirão de modo algum a uma divisão na lex credendi [lei da fé] da Igreja; são de fato dois usos do único Rito Romano. Por isso, é lícito celebrar o sacrifício da Missa segundo a edição típica do Missal Romano promulgada pelo Beato João XXIII em 1962 e nunca revogado, como forma extraordinária da Liturgia da Igreja” [6].

A possibilidade de uma serena e harmônica coexistência das duas formas do único Rito Romano foi, enfim, indiretamente afirmada também pela coexistência de ambos Ordines Missae (Beato João XXIII e Pablo VI) dentro do recente Compendium Eucharisticum, publicado pela Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos [7].

A coincidência destas diversas efemérides ditou também o tema que a seção Espírito da Liturgia se propõe a aprofundar este ano: o do “Sacerdote na Celebração eucarística”. Através destes breves artigos de periodicidade quinzenal, redigidos por teólogos, liturgistas e canonistas competentes, tentaremos apresentar de modo claro e acessível o papel e a tarefa do sacerdote nas diversas partes da Missa, tendo presentes ambos Missais, dos quais se celebram os aniversários. Desejo que estes artigos possam ajudar os sacerdotes a aproveitar a oportunidade de reflexão e de conversão oferecida pelo Ano Sacerdotal, e que possam estimulá-los a um cuidado cada vez mais atento do ars celebrandi. Esperemos também que as contribuições que se irão publicando pouco a pouco possam ajudar também o restante dos leitores – religiosos, religiosas, seminaristas, fiéis leigos – a reconsiderar com maior atenção e a venerar com profundo respeito religioso a grandeza do Mistério eucarístico e a dignidade do ministério sacerdotal, além de redescobrir sua centralidade na vida e na missão da Igreja.


--------
Notas

[1] Bento XVI, Lettera di Indizione dell’Anno Sacerdotale, 16.06.2009.

[2] Ibid.

[3] Ibid.

[4] I presbiteri «esercitano al massimo grado il loro sacro munus nel culto eucaristico o sinassi, nella quale, agendo in persona di Cristo [in persona Christi] e proclamando il suo mistero, uniscono i voti dei fedeli al sacrificio del loro Capo, e nel sacrificio della Messa rappresentano ed applicano l’unico sacrificio della nuova alleanza, cioè di Cristo che si offrì al Padre una volta per sempre come Vittima immacolata, fino alla venuta del Signore»: Concilio Vaticano II, Lumen gentium, n. 28: AAS 57 (1965), p. 34. Cf. anche Presbyterorum Ordinis, nn. 2; 12; 13.

[5] Cf. Paulo VI, Missale Romanum, 03.04.1969: AAS 61 (1969), p. 217.

[6] Bento XVI, Summorum Pontificum, 07.07.2007, art. 1.

[7] Cf. Congregatio de Cultu Divino et Disciplina Sacramentorum, Compendium Eucharisticum, LEV, Città del Vaticano 2009. La preparazione di questo testo era stata affidata direttamente dal Santo Padre, che ne aveva dato notizia nella Esortazione apostolica post-sinodale Sacramentum Caritatis, 22.02.2007, n. 93.

Fonte: Zenit