Por Rodolfo Papa*
ROMA, domingo, 12 de dezembro de 2010 (ZENIT.org) – Um distante concílio, o II Concílio de Niceia, no ano 787, definiu a correção do uso das imagens na Igreja, colocando de forma autorizada fim às tendências iconoclastas.
E no entanto em nossa contemporaneidade, dominada pelo uso obsessivo do que se vê, as igrejas frequentemente são projetadas e realizadas com uma postura que, quando se olha de perto, parece novamente iconoclasta: as paredes estão desnudas, não há imagens, quando muito, elementos estilizados, que aplicam linguagens emprestadas de experiências artísticas distantes do cristianismo, quando não inclusive contrárias a ele.
É oportuno portanto percorrer a antiga via da legitimação das imagens. Partamos precisamente do II Concílio de Niceia, analisando suas preciosas indicações: “nós definimos com todo o rigor e cuidado que, à semelhança da representação da cruz preciosa e vivificante, assim as venerandas e sagradas imagens pintadas quer em mosaico, quer em qualquer outro material adaptado, devem ser expostas nas santas igrejas de Deus, nas alfaias sagradas, nos paramentos sagrados, nas paredes e nas mesas, nas casas e ruas”. As imagens sagradas se colocam no mesmo plano que a representação da cruz, e à semelhança da cruz devem ser expostas em todo lugar: no contexto da liturgia, nos lugares sagrados, mas também na vida cotidiana, nos lugares privados como as casas, e nos lugares públicos como as ruas. A universalidade da mensagem cristã indica a medida dos lugares nos quais expor as imagens, quer dizer, todos os lugares. As imagens sagradas devem além disso estar presentes nos ornamentos sagrados e também nos paramentos. Não se detalha a técnica, de fato, as imagens podem ser pintadas, em mosaico, ou em qualquer outra técnica oportuna, mas se necessita do sujeito: “que sejam a imagem do senhor Deus e Salvador nosso Jesus Cristo, ou da Imaculada Senhora nossa, a Santa Mãe de Deus, dos santos anjos, de todos os santos e justos”. Portanto, trata-se claramente de imagens que representam prioritariamente Jesus Cristo, cuja encarnação é o princípio fundacional da arte sacra figurativa, e também a Mãe do Senhor, os anjos, os santos e os justos, quer dizer, todo o corpo da Igreja, seu mistério e sua história.
O Concílio precisa também os motivos e as finalidades das imagens sagradas: “de fato, quando mais prudentemente estas imagens forem contempladas, tanto mais aqueles que contemplam serão levados à recordação e ao desejo dos modelos originais e a tributar-lhes, beijando-as, respeito e veneração”. A contemplação das imagens induz à recordação e ao desejo dos sujeitos representados; trata-se portanto de uma dinâmica cognoscitiva e afetiva, que parte da imagem representada, mas termina no sujeito real; é análoga, poderíamos dizer, à função que as fotografias de nossos entes queridos têm, que nos recordam as pessoas amadas. Manter viva recordação e o desejo constitui um cuidado importante da própria fé, o cultivo da própria vida espiritual.
Trata-se de uma relação não idolátrica, porque a finalidade da adoração não é a imagem, mas o sujeito representado. De fato, o Concílio cuida em prevenir e deixar à margem os excessos que tinham estado presentes no Oriente cristão, e que tinham também induzido, em contrapartida, a reação iconoclasta. Não se trata, certamente, de uma verdadeira adoração (latria), reservada por nossa fé só à natureza divina, mas de um culto similar ao que se faz à imagem da cruz preciosa e vivificante, aos santos evangelhos e aos demais objetos sagrados, honrando-os com a oferenda do incenso e de luzes segundo o piedoso costume dos antigos. A honra feita à imagem, na realidade, pertence àquele que está representado, e quem venera a imagem venera a realidade de quem nela está reproduzido. Trata-se portanto de uma honra feita à realidade e não à representação, mas que através do culto feito à imagem se alimenta e se expressa a adoração por Deus, o único digno de ser adorado. Observemos que o correto parâmetro do culto da imagem está constituído pelo culto da cruz, preciosa e vivificante, e posto em analogia com o culto que se dá ao Evangelho, que obviamente não significa adoração do livro, mas da Palavra de Deus.
O Concílio sublinha que o culto das imagens forma parte da tradição da Igreja: “Assim se reforça o ensinamento dos nossos santos padres, ou seja, a Tradição da Igreja universal, que de um extremo ao outro da Terra acolheu o Evangelho. Assim nos tornamos seguidores de Paulo, que falou em Cristo, do divino colégio apostólico e dos santos Padres, mantendo a tradição que recebemos. Assim podemos cantar para a Igreja os hinos triunfais à maneira do profeta: “Alegra-te, filha de Sião, exulta filha de Jerusalém; goza e regozija-te com todo o coração; o Senhor tirou de teu meio as iniquidades dos teus adversários, foste libertada das mãos dos teus inimigos. Deus é rei no teu meio, não mais verás o mal”. O culto das imagens se legitima no ensinamento apostólico, na tradição da Igreja universal. Não só, mas se afirma depois que “o que se confiou à Igreja” é “o Evangelho, a representação da cruz, imagens pintadas ou as sagradas relíquias dos mártires”; portanto, as imagens pintadas formam parte do depósito da fé, do que foi “confiado” à Igreja, fugindo portanto ao arbítrio dos homens: ninguém pode decidir que se pode menosprezar o culto das imagens.
A tradição do culto às imagens é ininterrupta na Igreja Católica que, ao contrário, encontra nesta prática um sinal de distinção das tendências iconoclastas próprias de muitas correntes protestantes. O Concílio Vaticano II se coloca em continuidade com a tradição, e na Constituição sobre a Sagrada Liturgia, Sacrosanctum Concilium, afirma: “Mantenha-se o uso de expor imagens nas igrejas à veneração dos fiéis”. Analogamente ao Concílio de Niceia, afirma que a devoção deve ser correta, e sobretudo que o sentimento que se suscite não seja a admiração pela imagem, mas a veneração dos sujeitos apresentados: “Sejam, no entanto, em número comedido e na ordem devida, para não causar estranheza aos fiéis nem contemporizar com uma devoção menos ortodoxa”.
Talvez uma das reflexões mais claras e profundas sobre o uso das imagens sagradas está na introdução ao Compêndio do Catecismo da Igreja Católica (20 de março de 2005): [As imagens] “provêm do riquíssimo patrimônio da iconografia cristã. A tradição secular e conciliar diz-nos que também a imagem é pregação evangélica. Os artistas de todos os tempos apresentaram à contemplação e à admiração dos fiéis os fatos salientes do mistério da salvação, no esplendor da cor e na perfeição da beleza. Indício de que, hoje mais do que nunca, na época da imagem, a imagem sagrada pode exprimir muito mais que a palavra, pois é muito mais eficaz o seu dinamismo de comunicação e de transmissão da mensagem evangélica” (n. 5).
A imagem, durante os séculos, conseguiu transmitir os fatos sobressalentes do mistério da salvação, e muito mais hoje, na civilização da imagem, deve saber recuperar sua própria importância fundamental, enquanto que a imagem transmite mais que as próprias palavras, em um dinamismo de comunicação e transmissão da Boa Notícia.
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* Rodolfo Papa é historiador da arte, professor de história das teorias estéticas na Universidade Urbaniana, em Roma; presidente da Accademia Urbana delle Arti. Pintor, autor de ciclos pictóricos de arte sacra em várias basílicas e catedrais. Especialista em Leonardo Da Vinci e Caravaggio, é autor de livros e colaborar de revistas.
Fonte: Zenit