quinta-feira, 2 de abril de 2009

IV ANIVERSÁRIO DE MORTE DO SERVO DE DEUS JOÃO PAULO II


Totus tuus ego sum

HOMILIA DO PAPA BENTO XVI NO
III ANIVERSÁRIO DA
MORTE DO
SERVO DE DEUS JOÃO PAULO II


Praça de São Pedro
Quarta-feira, 2 de Abril de 2008


Queridos irmãos e irmãs!

A data de 2 de Abril permaneceu impressa na memória da Igreja como o dia da partida deste mundo do servo de Deus o Papa João Paulo II. Revivemos com emoção as horas daquele sábado à noite, quando a notícia da morte foi recebida por uma grande multidão em oração que enchia a Praça de São Pedro. Durante diversos dias a Basílica Vaticana e esta Praça foram verdadeiramente o coração do mundo. Um rio ininterrupto de peregrinos prestou homenagem aos despojos mortais do venerado Pontífice e o seu funeral marcou um ulterior testemunho da estima e do afecto, que ele tinha conquistado no coração de tantíssimos crentes e de pessoas de todas as partes da terra. Como há três anos, também hoje não passaram muitos dias depois da Páscoa. O coração da Igreja ainda está profundamente imerso no mistério da Ressurreição do Senhor. Na verdade, podemos ler toda a vida do meu amado Predecessor, em particular o seu ministério petrino, no sinal de Cristo Ressuscitado. Ele alimentava uma fé extraordinária n'Ele, e com Ele mantinha uma conversação íntima, singular e ininterrupta. Entre as numerosas qualidades humanas e sobrenaturais, de facto tinha a de uma excepcional sensibilidade espiritual e mística. Era suficiente observá-lo quando rezava: imergia-se literalmente em Deus e parecia que tudo o demais naqueles momentos não lhe dissesse respeito. As celebrações litúrgicas viam-no atento ao mistério-em-acto, com uma acentuada capacidade de captar a eloquência da Palavra de Deus no acontecer da história, a nível profundo do desígnio de Deus. A Santa Missa, como repetiu com frequência, era para ele o centro de cada um dos seus dias e de toda a sua existência. A realidade "viva e santa" da Eucaristia dava-lhe a energia espiritual para guiar o Povo de Deus no caminho da história.

João Paulo II faleceu na vigília do segundo Domingo de Páscoa; ao completar-se o "dia que o Senhor fez". A sua agonia durou o espaço desse "dia", neste espaço-tempo novo que é o "oitavo dia", querido pela Santíssima Trindade mediante a obra do Verbo encarnado, morto e ressuscitado. Nesta dimensão espiritual o Papa João Paulo II deu várias vezes provas de se encontrar de certa forma imerso já antes, durante a sua vida, e especialmente no cumprimento da sua missão de Sumo Pontífice. O seu pontificado, no seu conjunto e em muitos momentos específicos, parece-nos de facto como um sinal e um testemunho da Ressurreição de Cristo. O dinamismo pascal, que tornou a existência de João Paulo II uma resposta total à chamada do Senhor, não podia expressar-se sem a participação nos sofrimentos e na morte do divino Mestre e Redentor. "Porque esta palavra é verdadeira afirma o apóstolo Paulo se morrermos por Ele, também com Ele reviveremos; se perseverarmos, reinaremos com Ele" (2 Tm 2, 11-12). Desde criança, Karol Wojtyla tinha experimentado a verdade destas palavras, encontrando no seu caminho a cruz, na sua família e no seu povo. Ele decidiu muito cedo carregá-la juntamente com Jesus, seguindo as suas pegadas. Quis ser seu servo fiel até acolher a chamada ao sacerdócio como dom e compromisso de toda a vida. Com Ele viveu e com Ele quis também morrer. E tudo isto através da singular mediação de Maria Santíssima, Mãe da Igreja, Mãe do Redentor, íntima e efectivamente associada ao seu mistério salvífico de morte e ressurreição.

Guiam-nos nesta reflexão reevocativa as Leituras bíblicas há pouco proclamadas: "Não tenhais medo!" (Mt 28, 5). As palavras do anjo da ressurreição, dirigidas às mulheres junto do sepulcro vazio, que agora ouvimos, tornaram-se uma espécie de mote nos lábios do Papa João Paulo II, desde o início solene do seu ministério petrino. Repetiu-as várias vezes à Igreja e à humanidade a caminho rumo ao ano 2000, e depois através daquela meta histórica e também sucessivamente, no alvorecer do terceiro milénio. Pronunciou-as sempre com firmeza inflexível, primeiro agitando o báculo pastoral culminante na Cruz e depois, quando as energias físicas iam diminuindo, quase agarrando-se a Ele, até àquela última Sexta-Feira Santa, na qual participou na Via-Sacra da Capela particular estreitando a Cruz entre os braços. Não podemos esquecer o seu último e silencioso testemunho de amor a Jesus. Também aquele eloquente cenário de sofrimento humano e de fé, naquela última Sexta-Feira Santa, indicava aos crentes e ao mundo o segredo de toda a vida cristã. O seu "Não tenhais medo" não se fundava nas forças humanas, nem nos êxitos obtidos, mas unicamente na Palavra de Deus, na Cruz e na Ressurreição de Cristo. À medida que era despojado de tudo, por fim até da própria palavra, esta entrega a Cristo sobressaiu com crescente evidência. Como aconteceu a Jesus, também para João Paulo II no fim as palavras deixaram o lugar ao sacrifício extremo, à doação de si. E a morte foi o selo de uma existência totalmente doada a Cristo, conformada com Ele também fisicamente nas características do sofrimento e do abandono confiante nos braços do Pai celeste. "Deixai que eu vá para o Pai", foram estas testemunha quem estava próximo dele as suas últimas palavras, em cumprimento de uma vida totalmente dedicada ao conhecimento e à contemplação do rosto do Senhor.

Venerados e queridos irmãos, agradeço a todos por vos terdes unido a mim nesta santa Missa de sufrágio pelo amado João Paulo II. Dirijo um pensamento particular aos participantes no primeiro Congresso mundial sobre a Divina Misericórdia, que tem início precisamente hoje, e que pretende aprofundar o seu rico magistério sobre este tema. A misericórdia de Deus disse ele mesmo é uma chave de leitura privilegiada do seu pontificado. Ele queria que a mensagem do amor misericordioso de Deus alcançasse todos os homens e exortava os fiéis a ser suas testemunhas (cf. Homilia em Cracóvia-Lagiewniki, 18/8/2002). Por isso quis elevar às honras dos altares a Irmã Faustina Kowalska, humilde Religiosa que se tornou por misterioso desígnio divino mensageira profética da Divina Misericórdia. O servo de Deus João Paulo II tinha conhecido e vivido pessoalmente as terríveis tragédias do século XX, e durante muito tempo perguntou-se o que poderia impedir o alastramento do mal. De facto, só a Misericórdia Divina é capaz de pôr um limite ao mal; só o amor omnipotente de Deus pode derrotar a prepotência dos malvados e o poder destruidor do egoísmo e do ódio. Por isso, durante a última visita à Polónia, voltando à sua terra natal disse: "Não há outra fonte de esperança para o homem a não ser a misericórdia de Deus" (ibid.).

Damos graças ao Senhor por ter doado à Igreja este seu fiel e corajoso servidor. Louvemos e bendigamos a Bem-Aventurada Virgem Maria por ter velado incessantemente sobre a sua pessoa e sobre a humanidade interia. E enquanto oferecemos pela sua alma eleita o Sacrifício redentor, pedimos-lhe que continue a interceder do Céu por todos nós, por mim de modo especial, que a Providência chamou a reunir a sua inestimável herança espiritual. Possa a Igreja, seguindo os seus ensinamentos e exemplos, prosseguir fielmente e sem sujeições a sua missão evangelizadora, difundindo incansavelmente o amor misericordioso de Cristo, fonte de verdadeira paz para o mundo inteiro. Amém.


© Copyright 2008 - Libreria Editrice Vaticana